domingo, 1 de novembro de 2009

Béééé

- Béééé - disse o cabrito.
O Gafanhoto parou e ficou olhando.
- Que porra é essa, Mestre?
- Isso é um cigarrinho de erva, meu filho. Quando você...
- Não, Mestre, estou falando do cabrito.
- Mas que cabrito, meu Gafanhoto?
- Esse aí que tá parado aí no chão, fazendo bééé.
O Mestre pára e olha.
- Não sei do que você está falando, meu filho - o Mestre dá uma puxada no cigarro.
- É esse negócio com quatro patas aí.
- Béééé - concordou a criatura.
- Oras, meu filho, convenhamos, as suas peraltices já excederam o limite. Não acha que é hora de parar um pouco, deitar e relaxar? Sinto que suas vibrações chísticas estão meio dissonantes, não concorda?
- Sim, Mestre, mas...
- Sem mas nem meio mas. Você está precisando descansar. Aquela Lyza Brown te deixou exausto.
O Gafanhoto não entendeu. "Ahn?", pensou.
- Que Lyza Brown, Mestre?
- Aquela na música do... como era mesmo? Simão e Garfunco. "look around, Lyza Brown, and the sky is a hazy shade of winter...", o que eu acho a coisa mais estapafúrdia. Essas músicas de hoje em dia...
- ...
- E tem mais, você pela meditação noturna inteira saiu resmungando "lyza brown, andes cá, lyza rêizi nanananã". Tem cabrito nesse mato. Aliás, é Lyza Brown ou Lyza Rêizi? Você nem sabe o nome da menina! O que importa para você é atrair inocentes. Repugnante, essa cultura alienadora. Agora só falta virar comunista.
- Béééé - entoou o agora saltitante quadrúpede.
O Gafanhoto olhou o alegre mini-Bambi e tomou uma resolução. Nunca mais ouvir música moderna perto do Mestre. Já não bastasse ele ter confundido Beirut com sanduíche, e tê-lo castigado com dois dias sem música nem comida por misturar a sacra Arte Sublime à mundana Necessidade Corporal. Agora isso.
- Você deve estar usando drogas, Gafanhoto. Já falei para parar com isso. Agora, vamos voltar.
O Gafanhoto, derrotado, obedeceu-lhe cabisbaixo.
- Béééé - fez o quase-bode, seguindo-os aos pulinhos com o cigarrinho do Mestre na boca.


Final alternativo:
O Gafanhoto olhou o alegre mini-Bambi e tomou uma resolução. Enfiou o pontapé no bichinho.
Pegou bem entre o tórax e o abdome, na linha do diafragma, e o cabrito foi arremessado assim: -2x² + 3x - 5.
Como qualquer um com um nível de inteligência admissível pro Narrador Supremo pode aferir, esse polinômio tem raízes imaginárias.
O que significa que o cabritinho se deslocou no eixo "i" por algumas gerações, sofreu algumas guinadas pelas forças etéreas exercidas por apêndices citoplasmáticos dos zéfiros espaço-temporais gerados pelos fragores das ervinhas do Mestre, pelas correntes giratórias dos ascendentes espíritos de Leila Lopes, Dercy, Michael e Olívia, até surgir espontaneamente, meio atordoado em sua consciência do perigo mas plenamente funcional em seu instinto de pastar tranquilamente, no quintal de um jovem garoto que foi tomado de surpresa pela consequência inusitada da equação desferida pelo Gafanhoto.
Como tudo no Universo,
Continua...

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